
O sequenciamento genético de diferentes espécies de plantas e animais será utilizado, de forma pioneira, para monitorar espécies em risco de extinção e para subsidiar o planejamento de ações de preservação da biodiversidade brasileira. Iniciativa do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Instituto Tecnológico Vale Desenvolvimento Sustentável (ITV DS), o projeto Genômica da Biodiversidade Brasileira (GBB) já sequenciou 800 espécies da fauna e flora brasileira em cerca de dois anos, muitas delas que ainda não tinham qualquer tipo de referência genética disponível.
O pesquisador titular do Instituto Tecnológico Vale e pesquisador Líder do Projeto Genômica da Biodiversidade Brasileira (GBB), Alexandre Aleixo explica que o sequenciamento genético não é algo muito novo. O que aconteceu ao longo dos anos é que o sequenciamento genético passou a incluir, também, o genoma completo, que é o sequenciamento de toda a informação genética de um organismo, de todo DNA que tem na célula. “Começou com a espécie humana, por motivos óbvios, e em questão de menos de 10 anos, a gente passou a estudar de 5% do genoma, que era o que a gente conseguia trabalhar no início, até 100%”, esclarece. “O que acontece é que o avanço tecnológico no Brasil não foi muito rápido porque esses sequenciadores são caros. Então, embora o sequenciamento genético e genômico não seja algo novo, o que a gente está fazendo agora é novo, tanto porque estamos fazendo esses genomas completos, de 100%, como também porque estamos fazendo em uma escala, em uma quantidade que não tem nenhum precedente no país”.
O pesquisador aponta que o projeto teve início a partir do entendimento de que, no Brasil, não houve um avanço à altura da biodiversidade brasileira para essa parte da genômica. Diante disso, se buscou fazer um grande projeto que possibilitará avançar significativamente. “A Vale, através do Instituto Tecnológico Vale (ITV), fez uma articulação com o ICMBio, que é o órgão de gestão de políticas na área de conservação, no sentido de jogar esses dados genômicos para aquilo que era prioridade do ICMBio em termos de conservação e em termos até de promoção de algumas espécies da bioeconomia. Através de uma parceria público-privada, que foi assinada em 2022 e passou a vigorar em 2023, a nossa primeira grande tarefa foi, junto com ICMBio, definir quais seriam os alvos do projeto, ou seja, quais seriam as espécies a serem sequenciadas para o genoma completo”.

As discussões conjuntas levaram ao entendimento de que o sequenciamento deveria ter um foco principal em espécies ameaçadas, inclusive para que se conseguisse identificar se elas continuam com status de ameaça ou não, e se existem outras que deveriam entrar na lista de espécies ameaçadas, mas não entraram. Já na área da bioeconomia se considerou espécies que estão inseridas em cadeias produtivas desenvolvidas por populações tradicionais. “Além das espécies ameaçadas, o projeto também tem um foco nos genomas de espécies que são exploradas economicamente, principalmente na Amazônia, por populações tradicionais. O caso do açaí é um caso diferente porque ele já é um produto de exportação renomado, em escala, mas por incrível que pareça, ainda não tem nenhum genoma pronto do açaí. Esse é um genoma que a gente está trabalhando também e que deve ser lançado até o final desse ano”, aponta Alexandre. “Uma vez que esses genomas estejam disponíveis, embora a gente não faça melhoramento genético em si, são recursos essenciais para que, por exemplo, a Embrapa e até mesmo outras empresas trabalhem para fazer o melhoramento genético, para procurar aumentar a produtividade, etc”.
No caso das espécies ameaçadas, o pesquisador explica que, por exemplo, para que o ICMBio consiga encaixar uma espécie em algum critério de ameaça, eles dependem muito de uma informação que é muito difícil de se obter, no Brasil como um todo: quantos indivíduos daquela espécie existem no país. “Nós temos um país gigantesco, só a Amazônia e o Pará são gigantescos, então, se me perguntam qual é a estimativa populacional de onças no Pará, existe um grau de incerteza muito grande nessa estimativa. Por outro lado, se eu conseguir o genoma de 5 onças do Pará, eu consigo ter uma ideia de qual é o tamanho daquela população”, afirma o pesquisador. “Isso pode parecer um passe de mágica, mas no fundo é uma ciência que tem a ver com o fato de que dentro do genoma da onça eu tenho 3 bilhões de letrinhas, que na química são chamadas de bases pirimídicas. E a sequência dessas letrinhas vai me informar tudo, inclusive qual era o tamanho da população ancestral daquela onça”.
Alexandre compara o genoma a uma cápsula do tempo. Isso porque, segundo o pesquisador explica, ao sequenciar o genoma de uma pessoa e comparar esse genoma com o da população humana, o genoma dessa pessoa vai conseguir dizer quem eram e de onde vieram os seus ancestrais, qual era o tamanho daquela população, se essa pessoa teve, por exemplo, parentes próximos casando um com o outro, ou não. “Então, embora eu tenha menos indivíduos, no caso da onça, eu tenho bilhões de bits de informação que vão me contar isso. Então, acaba que hoje o critério de ameaça, como você encaixa uma espécie num determinado critério de ameaça, cada vez mais está usando medidas genômicas para fazer isso, com essa grande vantagem de que você não precisa de um trabalho de anos monitorando onças, o que é muito difícil. Então, é uma técnica inovadora”.

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Quando o projeto foi iniciado, esperava-se fazer até 2028, pelo menos 80 genomas de referência; 1.000 genomas populacionais, que são os genomas para mais de um indivíduo da mesma espécie; e 1.600 genomas mitocondriais, que são os genomas que vão apoiar as iniciativas de DNA ambiental e 1.600 amostras ambientais onde irão sequenciar o DNA da água, o DNA do solo para obter uma lista de espécies do que está presente ali.
Porém, nos dois anos em que o projeto está em andamento, já foram sequenciadas 800 espécies da fauna e flora brasileira. Desempenho que só é possível a partir do trabalho conjunto de diferentes pesquisadores e dos equipamentos de ponta instalados no ITV, em Belém. “Até agora a gente conseguiu a parceria de mais de 100 pesquisadores envolvidos em dezenas de instituições do Brasil, instituições acadêmicas, mas também em institutos de pesquisa, ONGs que trabalham com essas espécies e que viram no projeto uma oportunidade de ter dados genômicos inéditos. No ITV nós temos 42 pesquisadores bolsistas, que na verdade estão espalhados Brasil afora. Mas o projeto é muito maior, a gente pode dizer que quase 200 pessoas estão envolvidas no projeto”.
Com relação aos equipamentos, Alexandre Aleixo aponta que existe uma combinação de três sequenciadores no ITV que atendem ao projeto. “Hoje, essas máquinas que conseguem sequenciar o genoma completo, não tem muitas no Brasil. Aqui, em Belém, tem alguns na UFPA, mas só aqui no ITV nós temos uma combinação de sequenciadores. São pelo menos três plataformas de sequenciamento que entregam resultados diferentes. Então, no ITV a gente tem esses equipamentos todos juntos e isso dá uma capacidade de atender essas demandas do projeto de forma muito célere”.

PÚBLICAS
- Todas as referências genômicas produzidas pelo projeto serão tornadas públicas. Alguns desses dados já estão disponíveis em repositórios, inclusive mundiais, que qualquer pessoa pode ter acesso. É o caso, por exemplo, do genoma do peixe-boi.

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