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PROTESTOS

Cidades brasileiras registram atos por justiça no caso Moïse

No Rio de Janeiro, a manifestação foi em frente ao quiosque Tropicália, onde o jovem congolês foi morto

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Imagem ilustrativa da notícia Cidades
brasileiras registram atos por justiça no caso Moïse camera Ato em memória de Moïse Kabagambe, congolês morto em um quiosque na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro | Tomaz Silva/Agência Brasil

Imigrantes, ativistas e uma parcela da população de São Paulo foram até a avenida Paulista, na manhã deste sábado (5), protestar pela morte brutal do congolês Moïse Mugenyi Kabagambe, na manhã deste sábado (5).

Família de Moïse será incluída em programa de assistência

O ato começou por volta das 10h, de forma tímida e pacífica, com dezenas de pessoas. Os manifestantes ocupavam apenas o vão do MASP (Museu de Arte de São Paulo). Aos poucos, o movimento ganhou adeptos e a via, no sentido Centro, precisou ser bloqueada.

A paulistana Maísa Magacho soube do protesto, pela internet, e sozinha fez o seu cartaz e foi até o MASP. "Precisamos desestruturar o racismo, estamos já em 2022 e até quando? Esse tipo de situação é inaceitável e queremos igualdade, igualdade", diz a ourives.

A Polícia Militar, presente no local, afirmou que não fará estimativa do público presente. De acordo com organização, o ato reuniu aproximadamente 8.000 pessoas.

A manifestação foi tranquila na maior parte do tempo, mas houve um momento de tensão no início da tarde, quando um grupo passou a se dirigir em direção ao centro, rumo a praça do Ciclista. Um policial disse à Folha que não estava a programado a saída do Masp.

Pouco depois, por volta das 14h30, a organização encerrou oificialmente o ato. No entanto, um pequeno grupo insistia em ocupar a Paulista.

Após nova conversa entre a PM, que destacou mediadores para o local, membros da comissão de direitos humanos da OAB e manifestantes, ficou definido que todos seguiriam para República utilizando apenas a calçada.

"A organização [do protesto], previamente, não havia pedido acesso à Consolação, isso é essencial tanto para prefeitura e a polícia para bloquearem os trajetos, mas as pessoas insistiram. Uma parte foi embora, ficaram esses congoleses que dizem: "nossa casa é na República". Então com muita negociação com a PM, eles conseguiram voltar à Praça pela Augusta e terminou tudo em paz", afirmou Flávio Straus, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB.

Além de se solidarizarem pela morte de Moïse e pedir rigor na apuração do crime, os imigrantes africanos clamaram por igualdade, respeito e à atenção das autoridades brasileiras.

Alguns movimentos e partidários da esquerda aproveitaram a presença do público para fazer panfletagem, como membros do PSTU (Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado).

Houve, inclusive, quem pediu, em cartaz, a saída do presidente Jair Bolsonaro (PL) da presidência da República.​

O primeiro a discursar, da calçada da avenida Paulista, o angolano João Canda pediu por oportunidades ao povo negro. "Nós só escolhemos um refúgio no Brasil em razão da nossa cultura, dos nossos ancestrais. Este país é nosso também, temos direitos constitucionais e merecemos respeito", afirmou Canda.

O grupo Promigra (Projeto de Promoção dos Direitos de Migrantes), vinculado à faculdade de direito da Universidade de São Paulo (USP) e que presta assistência jurídica aos imigrantes nas áreas trabalhista, cível e familiar, marcou presença.

"Esse é um ato para dar visibilidade à xenofobia no Brasil", diz Caio Serra. "Grande parte deles vivem em condições análogas a escravidão. Muitos [empregadores] tiram proveito da falta informação e do medo deles, em situações de vulnerabilidade."

A Folha mostrou, em reportagem publicada na quinta (3), que o pagamento médio a um imigrante da República Democrática do Congo no mercado de trabalho formal brasileiro foi de R$ 1.862 em 2020, menos que a média geral dos imigrantes (R$ 4.878) e abaixo inclusive da média dos imigrantes africanos (R$ 2.698). Os dados são do último relatório anual do Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra).

Uma das organizadoras do protesto, a congolesa Claudine Shindany buscou refúgio no Brasil em 2014. Segundo ela, o país vive um difícil período de falta de hospitalidade. "O problema maior aqui hoje [sábado], é a nossa indignação pelo irmão Moïse, mas queremos chamar atenção das autoridades sobre como estamos sendo injustiçados, esquecidos", afirmou.

"Chega de sermos hostilizados, sermos ridicularizados no trabalho, nas escolas, nos hospitais", desabafou Shindany.

Além da comunidade congolesa, movimentos negros de São Paulo e de assistência aos imigrantes tomaram à frente dos protestos. Entre eles, a Coalizão Negra por Direitos, que diz ter denunciado a morte de Moïse ao Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial da ONU (Organização das Nações Unidas).

"Os imigrantes, sobretudo os africanos, são fragilizados e humilhados no Brasil. Essa indignação aqui [na Paulista] partiu delas, e temos que ajudá-los por toda essa vulnerabilidade", diz Adriana Moreira, da Uneafro, que integra a Coalizão Negra por Direitos.

Prudence Kalambay, que foi Miss Congo e mora no Brasil desde 2019, pediu para dizer apenas uma palavra: "Crueldade".Prudence tinha uma vida confortável em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, até que Joseph Kabila, que presidiu o país por duas décadas, até janeiro de 2019, passou a perseguir o seu patrão. Com medo das tropas de Kabila, Prudence fugiu para Angola, com a filha de quatro anos. Em Luana, se apaixonou pelas novelas brasileiras e quis morar no Brasil.

Já Moïse morava desde 2011 no Brasil. Na ocasião, ele tinha 13 quando desembarcou ao lado de três dos seus 11 irmãos. Aterrissou como refugiado da República Democrática do Congo, onde o pai é político (hoje trabalha na diplomacia, diz a família).

No Rio de Janeiro, ele vivia entre Madureira, onde mora a sua mãe, e na casa de primos e amigos em Barros Filho e Braz de Pina -todos na zona norte da cidade. Cursou até a segunda série do ensino médio e desde então fazia bicos em restaurantes, lanchonetes, quiosques e na praia.

No último dia 24 a sua vida chegou ao fim de forma cruel. Aos 24 anos, Moïse foi agredido por pelo menos quatro pessoas e ferido com 39 pauladas de taco de beisebol. De acordo com a sua família, o congolês havia ido ao quiosque reivindicar salários atrasados após prestar serviço como auxiliar de cozinha.Segundo o IML (Instituto Médico Legal), as pancadas com o taco de beisebol provocaram traumatismo no tórax, com contusão pulmonar, que causou a morte de Moïse.

Três homens foram detidos na terça (1º) e cumprem prisão temporária por 30 dias -​até que os todos os fatos sejam esclarecidos. São eles, Aleson Fonseca, 27, Brendon da Silva, 21, e Fábio Pirineus da Silva, 41.Os três suspeitos, que trabalham em barracas e quiosques da praia, contaram à Polícia que agiram para proteger o funcionário do Tropicália. Segundo eles, o congolês estava bêbado e queria pegar cerveja de graça no freezer.Aleson chegou a dizer, em depoimento, que "resolveu extravasar a raiva que estava sentindo", porque Moïse estava "perturbando há alguns dias".

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