Após reunião com o presidente Jair Bolsonaro para definir estratégias de reação ao Supremo, o ministro André Mendonça (Justiça) ingressou com um pedido de habeas corpus para Abraham Weintraub (Educação) a fim de "garantir liberdade de expressão dos cidadãos".
Com o pedido de habeas corpus, a ideia é impedir a prisão ou outra medida cautelar contra Weintraub no caso de ele se recusar a cumprir a determinação do STF de prestar depoimento.
O anúncio do ministro foi feito em uma rede social no início da madrugada desta quinta-feira (28). O habeas corpus, segundo o ministro da Justiça, foi ajuizado no STF (Supremo Tribunal Federal).
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De acordo com Mendonça, o pedido beneficia "de modo mais específico" Weintraub e as "demais pessoas submetidas ao inquérito [4.781, que investiga fake news e ataques ao Supremo]".
Ingressei c/ HC perante o @STF_oficial em razão do Inq 4781. A medida visa garantir liberdade de expressão dos cidadãos. De modo mais específico do Min @AbrahamWeint e demais pessoas submetidas ao Inquérito. Tbm visa preservar a independência, harmonia e respeito entre os poderes
— André Mendonça (@AmendoncaMJSP) May 28, 2020
Weintraub, que em reunião ministerial de 22 de abril disse que, por ele, "colocaria todos esses vagabundos na cadeia, começando no STF", agradeceu. "Obrigado!", escreveu no Twitter de Mendonça.
Agradeço o apoio do Min @AmendoncaMJSP https://t.co/RnbP0glNMs
— Abraham Weintraub (@AbrahamWeint) May 28, 2020
O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news no STF, mandou Weintraub prestar depoimento em cinco dias à Polícia Federal em razão da afirmação feita na reunião ministerial.
Para ele, há "indícios de prática" de seis delitos. Segundo o Código Penal, Weintraub pode ser enquadrado por difamação e injúria. Os demais constam de quatro artigos da lei que define crimes contra a segurança nacional e a ordem política e social.
Moraes autorizou também a operação da PF nesta quarta-feira (27) que colocou deputados, blogueiros e empresários bolsonaristas na mira do Supremo.
Irritado com a operação autorizada pelo STF que atingiu deputados da base e apoiadores, o presidente Jair Bolsonaro reuniu ministros nesta quarta-feira para definir uma reação à corte.
Segundo auxiliares presentes, ele avaliou como absurda e desnecessária a investigação contra aliados, considerou que se trata de uma retaliação e reforçou que o Executivo não pode aceitar calado.
A primeira medida que ficou definida era que a AGU (Advocacia-Geral da União) ingressaria com pedido de habeas corpus para Weintraub não preste depoimento ao STF. O pedido, porém, foi feito por Mendonça, que, antes de substituir Sergio Moro na atual pasta, ocupou o cargo de advogado-geral da União.
No pedido, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, Mendonça escreve que o HC "é resultado de uma sequência de fatos que, do ponto de vista constitucional, representam a quebra da independência, harmonia e respeito entre os Poderes desejada por todos".
Entres os exemplos cita a convocação de Weintraub para depor e a operação desta quarta-feira envolvendo, segundo ele, "cidadãos que não representam riscos à sociedade, cujos direitos à liberdade de expressão estão sendo objeto de flagrante intimidação ou tentativa de cerceamento".
"Qualquer confusão que se trace entre a disseminação de notícias falsas, ou 'fake news', com o pleno exercício do direito de opinião e liberdade de expressão pode resvalar em censura inconstitucional, aliás, como alguns sugerem já ter ocorrido nestes autos relativamente a uma muito conhecida revista semanal eletrônica", escreveu.
Foi no âmbito deste inquérito que Moraes mandou tirar do ar reportagem dos sites da revista Crusoé e O Antagonista que ligavam Toffoli à empreiteira Odebrecht. Dias depois, o ministro voltou atrás e derrubou a censura. O inquérito das fake news apura a disseminação de notícias falsas, ofensas, ataques e ameaças contra integrantes do STF.
Mendonça pede a suspensão do depoimento de Weintraub e a exclusão do colega do inquérito ou trancamento do inquérito.
Se os pedidos não forem acatados, pede ainda para que Weintraub seja reconhecido como investigado, e não testemunha, o que lhe daria o direito de interrogado ao final do inquérito e ainda permanecer em silêncio. Pede que possa se pronunciar também por escrito.
O ministro da Justiça pediu também, "por questão de isonomia e coerência, a extensão dos pedidos a todos aqueles que tenham sido objeto de diligências e constrições no âmbito do inquérito cujo trancamento é aqui demandado".
Bolsonaro, em reunião com aliados, também discutiu outras iniciativas de resistência, mas ainda não se chegou a uma definição.
Entre elas, a sugestão para que o ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, não acate nenhum pedido de diligências no âmbito de um pedido de impeachment contra o ministro que foi apresentado ao tribunal e é relatado por Celso de Mello.
O núcleo ideológico defendeu ainda que o presidente insista mais uma vez na nomeação do delegado Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal. Moraes suspendeu a posse do amigo do presidente no mês passado.
Com exceção do pedido de habeas corpus, as demais propostas não foram unânimes na reunião, o que levou o presidente a rediscuti-las com o núcleo jurídico do governo.
Para tratar do tema, Bolsonaro se reuniu no início da noite no Palácio da Alvorada com Mendonça. Horas depois, o ministro da Justiça fez o anúncio no Twitter.
De acordo com relatos feitos à Folha, no encontro também foi lido um texto de 2019 atribuído ao advogado Modesto Carvalhosa que sugeriu a prisão preventiva dos ministros Dias Toffoli e Moraes por causa do inquérito das fake news.
Outra ideia discutida é a divulgação de uma nota descrevendo a reação planejada. Caso Bolsonaro siga essa linha, aprofundará ainda mais a crise do governo com o Judiciário.
Segundo assessores do presidente, Bolsonaro avaliou nesta quarta-feira que a operação deflagrada teve como objetivo atingi-lo. O presidente discutiu o assunto com ministros, inclusive com o titular da Defesa, Fernando Azevedo.
Na noite desta quarta, Bolsonaro também foi às redes sociais para comentar a operação da PF. Ele afirmou haver sinal de que "algo de muito grave está acontecendo com nossa democracia". O presidente disse ainda que nenhuma violação à liberdade de expressão "deve ser aceita passivamente".
"Ver cidadãos de bem terem seus lares invadidos, por exercerem seu direito à liberdade de expressão, é um sinal que algo de muito grave está acontecendo com nossa democracia", escreveu em rede social. "Estamos trabalhando para que se faça valer o direito à livre expressão em nosso país. Nenhuma violação desse princípio deve ser aceita passivamente!", completou mais tarde.
A manifestação do presidente da República indica a irritação com a operação que atingiu deputados da base e apoiadores. A operação da Polícia Federal contra fake news mira blogueiros, empresários e oito deputados bolsonaristas.
Os deputados não foram alvo de mandados de busca e apreensão, mas Moraes determinou que sejam ouvidos em dez dias e que suas postagens em redes sociais sejam preservadas.
Trata-se dos deputados federais Bia Kicis (PSL-DF), Carla Zambelli (PSL-SP), Daniel Lúcio da Silveira (PSL-RJ), Filipe Barros (PSL-PR), Junio do Amaral (PSL-MG), Luiz Phillipe Orleans e Bragança (PSL-SP), além dos deputados estaduais Douglas Garcia (PSL-SP) e Gil Diniz (PSL-SP).
QUE PONTOS DO INQUÉRITO ESTÃO SENDO QUESTIONADOS?
Ato de ofício
Toffoli abriu o inquérito sem provocação de outro órgão, o que é incomum. Segundo o STF, porém, há um precedente: uma investigação aberta de ofício pela Segunda Turma da corte no ano passado para apurar o uso de algemas na transferência de Sérgio Cabral (MDB-RJ).
Competência
A investigação foi instaurada pelo próprio Supremo, quando, segundo críticos, deveria ter sido encaminhada para o Ministério Público. O argumento é que o órgão que julga não pode ser o mesmo que investiga, pois isso pode comprometer sua imparcialidade.
Relatoria
O presidente da corte designou o ministro Alexandre de Moraes para presidir o inquérito, sem fazer sorteio ou ouvir os colegas em plenário. Assim, Moraes é quem determina as diligências investigativas.
Foro
O que determina o foro perante o STF é quem cometeu o delito, e não quem foi a vítima. Para críticos, a investigação não deve correr no Supremo se não tiver como alvo pessoas com foro especial. Moraes disse que, localizados os suspeitos, os casos serão remetidos às instâncias responsáveis por julgá-los.
Regimento
Toffoli usou o artigo 43 do regimento interno do STF como base para abrir a apuração. O artigo diz que, "ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito". Críticos dizem que os ataques pela internet não ocorrem na sede do Supremo, mas Toffoli deu uma interpretação ao texto de que os ministros representam o próprio tribunal.
Liberdade de expressão
Moraes pediu o bloqueio de redes sociais de sete pessoas consideradas "suspeitas de atacar o STF". A decisão foi criticada por ferir o direito à liberdade de expressão. O mesmo pode ser dito sobre a censura, depois derrubada, aos sites da revista Crusoé e O Antagonista.
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