Depois da repercussão negativa nacional e de um pedido de investigação feito pela vereadora de Belém, Lívia Duarte (PSOL), o Conselho Regional de Medicina (CRM-PA) anunciou ontem (25), que vai investigar, porém sob sigilo, o caso do médico ginecologista e obstetra Allan Henrique Fernandes Rendeiro, de 65 anos, que no dia 22 de outubro intimidou um casal durante o parto de seu bebê para que declarassem voto em Jair Bolsonaro (PL), em uma maternidade de Belém.
Em nota, a entidade faz menção ao episódio, mas não ao nome de Rendeiro, e informa que “efetivará todas as medidas legais previstas na Lei nº 3.268/57 e Resoluções do Conselho Federal de Medicina, a fim de apurar o fato”. O sigilo para esse tipo de investigação é previsto no Código de Processo Ético-Profissional. A Coordenadoria da Mulher de Belém, ligada à prefeitura municipal, também pediu ao CRM que apure o caso.
A parlamentar argumenta que a conduta do médico incorre na prática de tentativa de coagir alguém a determinado posicionamento político, ora classificada como assédio eleitoral ou político, portanto considerada crime pelos artigos 299 e 301 do Código Eleitoral Brasileiro.
Médico bolsonarista intimida pais na hora do parto em Belém
Deputada estadual eleita para a legislatura 2023-2026 da Assembleia Legislativa, Lívia também oficiou o Ministério Público do Estado do Pará para que investigue o caso, mas em nota o MPPA comunicou que seu Núcleo Eleitoral ainda não havia recebido nenhuma denúncia sobre o fato até ontem, 25. “Caso o MPPA seja acionado, encaminhará os autos para distribuição do promotor que exerça função eleitoral em Belém”, continua o documento.
Allan Rendeiro é inclusive servidor efetivo do Ministério Público, no cargo de Técnico Especializado Médico. Atualmente ele ocupa a função de Chefe de Divisão - Assistência Intermediária e é lotado no Departamento Médico-Odontológico do órgão.
ENTENDA
No vídeo, gravado pelo próprio médico no último sábado, 22, Allan Rendeiro mostra a criança recém-nascida, cita o nome do bebê e em seguida filma o pai. “Eu sou ****, já nasci 22 e vou votar no Bolsonaro”, narra o obstetra enquanto filma.
Em seguida, se queixa. “Eu vou começar a reclamar aqui no hospital para diferenciar o negócio do pai, eles botam uma roupa vermelha. O doido não vem dizer que vai votar no Lula [...] rapaz tu quer que eu vá já embora e nem opere ela”, comenta Rendeiro, novamente mostrando o pai da criança.
A próxima a ser exposta então é a mãe, ainda no início do pós-parto, deitada na maca, com uma expressão sonolenta no rosto. “Essa aqui é a mamãe do ****, dia 30 ela vota...22! Vou mandar pro Bolsonaro esse vídeo que ele está em uma live especial”, finalizou o médico. A mulher apenas sorri, desconfortável, chegando a virar a cabeça para o lado em determinado momento, em sinal de incômodo.
O vídeo foi postado no perfil do Instagram de Rendeiro e ficou disponível durante parte da manhã daquele dia. Porém, após receber comentários indignados pela publicação, ele apagou o post. A conta do médico é fechada para não seguidores, o que significa que só aqueles que o seguem podem ver o que ele posta, e comentar.
Deputada eleita pede que CRM investigue médico bolsonarista
Algumas horas depois, ele publicou o mesmo vídeo novamente no Instagram e também no Twitter, só que com um áudio de conteúdo diferente do primeiro, sem qualquer menção a política. Mas as postagens também foram apagadas depois.
NEGOU
Em nota enviada por e-mail ao DOL, o obstetra, que detalhou já ter realizado mais de cinco mil partos aos longos dos 40 anos de exercício profissional, afirmou desconhecer o referido vídeo e o que foi dito nele. “Agora (sic) a pouco verifiquei o aplicativo onde publico vídeos sobre o nascimento de crianças que tenho a felicidade de fazer o parto e pergunto aos pais se existe alguma objeção sobre publicar os vídeos. Existem centenas de vídeos publicados e não se coadunam com os dizeres a mim atribuídos”, justifica.
Rendeiro foi candidato a deputado estadual pelo partido PHS em 2018 - sigla que foi incorporada ao Podemos. Em sua declaração eleitoral, ele citou a propriedade de quase 40 armas de fogo.
Sem querer se identificar, o pai do recém-nascido buscou o DOL para explicar o ocorrido, e contou que a gravação foi feita no próprio celular dele pelo médico. E que o vídeo que repercutiu se trata de “uma edição que não corresponde com a verdade”.
Médico Allan: caso chegou ao Conselho Regional de Medicina
Segundo o homem, o Rendeiro não teria mencionado comentários de cunho político e o vídeo que, vale ressaltar, foi publicado no próprio perfil do profissional nas redes sociais, estaria “fora de contexto”. Ele diz ainda que o médico é um “excelente profissional” e acompanhou toda a gravidez da esposa.
Questionado sobre como o vídeo em questão teria ido parar nas redes sociais, o homem não soube responder, assim como não explicou o motivo pelo qual a publicação foi apagada horas após repercutir entre os internautas, pois, segundo Rendeiro, a conta não o pertence.
Dependendo do resultado da sindicância, Allan Rendeiro poderá assinar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC). Caso o CRM-PA entenda que a situação ofereceu risco à integridade da paciente e que houve infração ética, o procedimento vira processo.
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