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DENÚNCIA

MP vai investigar suspeita de compra superfaturada de bombas

O ex-secretário de Saúde de Zenaldo Coutinho, Sérgio Amorim, é acusado de pagar 217% a mais por equipamentos para covid-19

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Imagem ilustrativa da notícia MP vai investigar suspeita de compra superfaturada de bombas camera Sérgio Amorim foi secretário de Zenaldo e é suspeito de também comprar bombas de ventiladores pulmonares a preços superfaturados | Ricardo Amanajás e Celso Rodrigues

O Ministério Público do Pará (MP-PA) instaurou Inquérito Civil para investigar a compra de 37 bombas de infusão, em abril do ano passado, pelo ex-secretário municipal de Saúde, Sérgio Amorim, na administração do ex-prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho. Segundo um Relatório Técnico do MP-PA, há indícios de um superfaturamento de 217% na aquisição desses equipamentos. Cada bomba custou R$ 14 mil, ou quase o triplo dos R$ 5.250,00 pagos pelo Governo do Estado à SKN do Brasil, na mesma época, por um modelo de bombas superior e mais adequado aos pacientes da Covid-19. As bombas de Amorim, foram compradas sem licitação e custaram aos cofres públicos mais de meio milhão de reais. A empresa beneficiada foi a AC Franco de Almeida Comércio Mat Hospitalares Eireli, que funciona em uma sala, no município de Ananindeua, mas declarou à Receita Federal 41 atividades, incluindo fabricação de tecidos, serviços de Engenharia e a venda de “quentinhas”. Amorim é cunhado do ex-Procurador Geral de Justiça (PGJ) do Pará, Gilberto Martins.

A abertura do Inquérito Civil foi determinada, no último 5 de maio, pelo promotor de Justiça José Godofredo Pires dos Santos, da 2ª Promotoria de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa. Até então, quem estava à frente da 2ª Promotoria e responsável pela apuração era a promotora Mariela Corrêa Hage. A denúncia chegou às mãos dela em 22 de junho do ano passado. Em 31 de agosto, um Relatório Técnico assinado pela contadora Wandrea da Costa Ranieri, assessora técnica especializada do MP-PA, apontou indícios de um superfaturamento de 217%. No entanto, Mariela só abriu oficialmente uma investigação, com a instauração de um Procedimento Preparatório, em 29 de outubro. Em 28 de janeiro deste ano, ela prorrogou o procedimento por mais 90 dias e enviou o caso ao Grupo Técnico Interdisciplinar (Gati) do MP-PA, para nova análise. Essa havia sido a última movimentação do caso até que, em 9 de abril, quatro dias após um pedido de informações do DIÁRIO, ele voltou a andar. Mariela tentou arquivar, junto ao Conselho Superior do MP-PA, a denúncia de superfaturamento na compra de azitromicina, também por Amorim.

A Resolução 23/2001, do Conselho Nacional do Ministério Público (CNPM), estabelece que Procedimentos Preparatórios têm prazo de conclusão de 90 dias, prorrogável apenas uma vez, por outros 90. A partir daí o promotor tem de decidir se arquiva o caso, ajuíza uma Ação Civil Pública (ACP) ou converte a investigação em Inquérito Civil. Um despacho do promotor José Godofredo informa que o processo ainda se encontra em análise pelo GATI. Já a Portaria 007/2021, daquele mesmo dia, diz, entre vários “considerandos”, que ele optou pelo Inquérito Civil tanto pelo tempo já decorrido desde a abertura do Procedimento Preparatório, quanto pela necessidade de finalizar diligências, ou até de realizar outras. A Portaria não menciona, mas também sinaliza outro fato: se o promotor ainda não se sente seguro para ajuizar uma ACP, também não tem como arquivar o caso, justamente pelos indícios de irregularidades existentes. A partir da pesquisa de duas licitações dos estados de Roraima e de Minas Gerais, o Relatório concluiu que o preço médio dessas bombas ficou em R$ 4.416,38.

PROCESSOS

Na primeira reportagem sobre o caso, em 28 de junho do ano passado, o DIÁRIO também mostrou esses indícios de superfaturamento, só que através de uma pesquisa mais ampla: 11 processos de compra, em vários estados, que resultaram em um preço médio de R$ 5.237,16. Um dos fatos mais impressionantes é que até na pesquisa de mercado da Prefeitura de Belém, para a aquisição dessas bombas, o preço médio ficou em R$ 6.347,00. Além disso, em 23 de março do ano passado, um mês antes de adquirir essas bombas de R$ 14 mil, o próprio Amorim pagou R$ 5.200,00 e R$ 6.335,67 por unidade desses equipamentos, no Pregão Eletrônico 7/2020, da Secretaria Municipal de Saúde (SESMA). Pior: no Pregão 01/2020, realizado em 24 de março do ano passado, a Secretaria de Saúde do estado de Roraima comprou cada bomba de infusão por apenas R$ 2.250,00, junto à Samtronic Indústria e Comércio. As 20 bombas compradas naquele Pregão têm descrição idêntica às de Amorim.

PARA ENTENDER

AS BOMBAS DE INFUSÃO

Bombas de infusão são equipamentos eletrônicos que ajudam a administrar, através das veias ou diretamente nos intestinos, por exemplo, desde soro e alimentação até remédios usados apenas em hospitais. As mais indicadas para as Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) são semelhantes àquelas que o Governo comprou a R$ 5.250,00, para os pacientes mais graves da Covid-19, que permanecem vários dias intubados e sedados. Bombas desse tipo permitem até acoplar uma seringa, que é pressionada em um nível constante pela própria máquina, o que traz um elevado grau de precisão à administração de medicamentos muito concentrados, que têm de ser liberados de forma bem lenta no organismo.

Empresa recebeu da Prefeitura 10 vezes o seu capital

As 37 bombas de Amorim foram compradas através do contrato 231/2020, assinado em 28 de abril do ano passado, e que incluiu outros equipamentos. Ele possuía vigência de 6 meses e valor inicial de R$ 888 mil, mas, por força de um aditivo de R$ 162 mil, acabou indo parar em mais de R$ 1 milhão. A empresa que ganhou o contrato, a AC Franco de Almeida, possui um capital de apenas R$ 110 mil, ou dez vezes menos do que recebeu da SESMA. Ela tem o nome de fantasia de Kanner Comércio e Serviço e funciona em uma sala, em Ananindeua. Mas declarou à Receita Federal 41 atividades. A principal é a manutenção e reparação de aparelhos eletromédicos e eletroterapêuticos e equipamentos de irradiação. Ou seja, o que ela faz, principalmente, é consertar equipamentos como essas bombas. Os dois únicos contratos anteriores dela com a SESMA, em 2016 e 2017, foram justamente para a manutenção de equipamentos odontológicos e médico-hospitalares. Até o e-mail dela, mesmo no contrato das bombas de infusão, é kannermanutenção.

Em geral, a declaração de um leque tão amplo de atividades indica um artifício conhecido como “guarda-chuva”, para a obtenção de contratos com o Poder Público, especialmente, em se tratando de empresas com capital e estrutura reduzidos. Entre as 40 atividades secundárias da AC Franco de Almeida estão, por exemplo, a fabricação de tecidos, roupas e móveis; conserto de máquinas e aparelhos de refrigeração e ventilação; comércio atacadista de artigos de vestuário, cama, mesa, banho, roupas e acessórios de segurança no trabalho, entre outros. O leque ainda inclui o comércio varejista de móveis, bicicletas, instrumentos musicais, além de serviços de aluguel de equipamentos científicos, médicos e hospitalares e fornecimento de “quentinhas”. Tudo isso em uma sala e com R$ 110 mil de capital.

O caso dessas bombas de infusão não é, porém, o único sob investigação que envolve Sérgio Amorim. Ainda mais grave é a suspeita de um rombo superior a R$ 1 milhão nos cofres da Prefeitura de Belém, com a compra de ventiladores pulmonares e outros equipamentos médicos pela SESMA, junto à GM Serviços Comércio e Representação. Em outubro do ano passado, a Operação Quimera, da Polícia Civil, cumpriu mandados judiciais de busca e apreensão em vários endereços ligados à empresa e à Amorim. Ele chegou a ter seus bens bloqueados pela Justiça e, quatro dias depois da operação, foi exonerado da SESMA. A GM Serviços, que foi aberta em 2012 como uma cafeteria, também possui, segundo a polícia, um leque “guarda-chuva”: 35 atividades, incluindo até psicanálise. No entanto, durante a Operação Quimera, a polícia não conseguiu encontrar a empresa em funcionamento em nenhum dos endereços que registrou, apesar dos vários contratos que ganhou da SESMA, a maioria sem licitação, para várias atividades. Em dezembro, a polícia indiciou Amorim por fraude licitatória, associação criminosa e outras irregularidades, que podem resultar em até 18 anos de prisão.

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