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SOB SUSPEITA

AGE denuncia ex-secretário de Transportes de Jatene ao MPC

Um possível rombo de R$ 6 milhões nos cofres públicos levou a Auditoria Geral do Estado (AGE) a denunciar ao Ministério Público de Contas (MPC) o ex-secretário de Transportes do Governo Jatene, Kleber Ferreira Menezes, e quatro funcionários da Secretaria

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Imagem ilustrativa da notícia AGE denuncia ex-secretário de Transportes de Jatene ao MPC camera Setran, cujo titular era Kleber na gestão de Jatene, contratou empresa para restaurar rodovia, que teria recebido 94,64% do valor do contrato, mas executou apenas 36,55% do serviço. | Cristino Martins/Arquivo/Agência Pará

Um possível rombo de R$ 6 milhões nos cofres públicos levou a Auditoria Geral do Estado (AGE) a denunciar ao Ministério Público de Contas (MPC) o ex-secretário de Transportes do Governo Jatene, Kleber Ferreira Menezes, e quatro funcionários da Secretaria Estadual de Transportes (Setran). O caso envolve a BRT Construtora e Engenharia Ltda, que foi contratada pela antiga administração da Setran para restaurar a PA 416, entre a rodovia BR 316 e o distrito de Americano, no município de Santa Izabel do Pará.

Segundo a AGE, a empresa recebeu 94,64% do valor do contrato, mas executou apenas 36,55% do serviço. Além disso, abandonou a obra, o que obrigou o novo governo a contratar outra empresa, para concluí-la. Ainda não se sabe o paradeiro de boa parte dos mais de R$ 6 milhões que ela recebeu. O caso também foi denunciado à Diretoria de Combate à Corrupção (Decor), da Polícia Civil.

A Representação da AGE foi protocolada no MPC no último 3 de fevereiro. Segundo o documento, ela começou a investigar o caso em 16 de dezembro do ano passado, após uma visita técnica à obra e à análise de vários documentos. Na visita, constatou-se o abandono e a execução de apenas 1,4 km de restauração, contra os 3,83 km previstos no contrato.

Além disso, os registros do Siafem, o sistema de administração financeira de estados e municípios, mostraram que a Setran havia empenhado R$ 6,286 milhões em favor da BRT, ou quase a totalidade do valor contratual. Cópias de Ordens Bancárias (OBs), obtidas junto ao Banco do Estado do Pará (Banpará), comprovaram que a empresa recebeu R$ 6,217 milhões, de um contrato que era de R$ 6,569 milhões.

Outro problema é que o relatório da visita técnica também revelou vários defeitos nos poucos serviços da BRT. As fotos mostram o desnível do leito da rodovia, em um dos trechos em que foi executada terraplanagem, além de poças d’água, causadas por depressões no solo. Em outro trecho, supostamente asfaltado, também há uma poça d’água, além de um acostamento com ondulações e finíssima camada de asfalto.

Também há calçadas quebradas e cheias de mato, sem sinal de serviços recentes. Na verdade, segundo o relato de um dos fiscais da obra, o engenheiro Francisco Leonardo Dias Tomaz, que está entre os denunciados pela AGE, até setembro do ano passado a empresa não havia concluído nem os serviços de drenagem, apesar de o saldo contratual (o que ela ainda tinha a receber) não chegar nem a R$ 300 mil. E já naquela altura, segundo ele, a BRT havia interrompido o serviço, sem aviso ou justificativa.

Devido às irregularidades, a AGE suspendeu a BRT das licitações do Governo, até o final das investigações. A empresa alegou, em sua defesa, que teve de executar serviços imprescindíveis, mas que não estavam previstos no projeto original da obra, como tapa-buracos, regularização asfáltica e drenagens, e que isso causou um “desequilíbrio econômico contratual”.

Disse, também, que precisava de mais dinheiro: um aditivo superior a R$ 1,552 milhão, que teria solicitado à Setran, em fevereiro do ano passado. Estranhamente, porém, como comprovou a AGE, a empresa recebeu mais de R$ 6, 217 milhões, entre maio e dezembro de 2018, ou 94,64% do valor contratual. E como só executou 36,55% do serviço, recebeu pagamentos antecipados, o que é proibido por Lei, disse ao DIÁRIO o auditor-geral do Estado, Giussepp Mendes.

Ele também acentuou o paradeiro incerto da maior parte desse dinheiro, devido à grande distância entre o que foi pago e o que teria sido executado (menos de R$ 2,3 milhões). Disse, ainda, que a maioria dos documentos que a empresa apresentou em sua defesa, para justificar os serviços executados sem previsão no projeto, não constam no processo da obra e nem trazem registro comprobatório de que foram entregues à Setran.

Diários

A exceção, segundo ele, são os diários da obra, do período entre agosto e novembro de 2018, que demonstram o acompanhamento do serviço por um dos fiscais do contrato, o engenheiro Valter Costa e Silva, outro dos denunciados pela AGE. “Quase todos os documentos que a empresa nos entregou foram produzidos unilateralmente por ela e não há qualquer comprovante de que foram recebidos pela Setran”, disse Giussepp.

Ele contou que a AGE resolveu inspecionar a obra devido a um protesto de moradores de Americano, contra o atraso e abandono do serviço, fato amplamente divulgado pela imprensa. Na visita, em 18 de novembro do ano passado, o funcionário da AGE constatou que a restauração não chegara nem à metade, apesar de ter começado em janeiro de 2018, com prazo inicial de conclusão até agosto daquele ano.

Além disso, ele não encontrou no local qualquer funcionário ou maquinário da BRT, indicando “provável abandono da execução das obras”. Ainda em novembro do ano passado, a Setran contratou outra empresa, a Ameta, para terminar o serviço. Ela iniciou as obras naquele mesmo mês e conseguiu concluí-las em janeiro deste ano. Ou seja: fez em 45 dias o que a BRT não conseguiu nem em 750, observa Giussepp.

AGE denuncia ex-secretário de Transportes de Jatene ao MPC
📷 |Celso Rodrigues/Diário do Pará

Problemas

Ainda há muito a explicar na restauração da PA 416. Os fatos nebulosos começaram ainda na licitação da obra, em 2017. Na primeira sessão, compareceram apenas duas empresas: além da BRT, a Rodoplan Serviços de Terraplanagem Ltda, construtora enrolada até o pescoço no escândalo do Asfalto na Cidade e que pertence à mulher do prefeito de Bragança, o tucano Raimundo Nonato de Oliveira.

Já na segunda sessão, a Rodoplan não apareceu. E aí, a BRT, apesar de sozinha na parada, acabou desclassificada, devido à falta de alguns serviços, em sua planilha de preços. No entanto, como era a única concorrente, a Comissão Permanente de Licitação (CPL) concedeu-lhe 8 dias, para que apresentasse nova proposta, o que estaria amparado pela 8666/93, a Lei das Licitações.

A nova proposta, no valor de R$ 5,389 milhões, foi declarada vencedora e o contrato, com vigência de 210 dias, foi assinado em 08 de janeiro de 2018. Mas já em 22 de março, ou seja, dois meses depois, a BRT pediu à Setran um aditivo de preço, devido a serviços de drenagem que não estariam previstos na planilha. No entanto, como o aditivo ultrapassava o limite legal, que é de 25% do valor contratual, refez a proposta. Assim, conseguiu um aumento de 21,89% (ou R$ 1,179 milhão), assinado em agosto daquele ano, que elevou o contrato para R$ 6,569 milhões.

Além disso, entre junho de 2018 e agosto do ano passado, a empresa também obteve três aditivos de prazo, que, no total, prorrogaram o contrato por 540 dias, ou mais que o dobro dos 210 dias previstos inicialmente. As justificativas foram as fortes chuvas; serviços que a prefeitura realizava na rede de água e que estariam atrapalhando a recuperação da rodovia; e até “a falta de projeto executivo”. Outro problema, segundo a AGE, é que um dos fiscais da obra, o engenheiro Francisco Leonardo Dias Tomaz, também integrou a comissão de licitação do serviço, o que fere o princípio da segregação de funções, conforme a jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU).

Na denúncia, Giussepp Mendes destaca que a Lei 8666/93 estabelece que é prerrogativa e dever da administração pública fiscalizar a execução de seus contratos e que a falta dessa providência pode causar graves danos ao erário. No entanto, a Setran nem mesmo formalizou a nomeação dos fiscais do contrato com a BRT, embora a documentação permita identificar que Francisco Leonardo e Valter Costa e Silva exerceram essa função.

Além deles e do secretário de Transportes da época, Kleber Ferreira Menezes, também foram denunciados os engenheiros Hélio Nunes Cardoso e Paulo Mariano Soares de Oliveira, então diretor técnico de Transportes da Setran.

Semelhança com o caso do escândalo do Asfalto na Cidade

A restauração da PA 416 lembra as obras do Asfalto na Cidade, um dos maiores escândalos do Pará, no qual a AGE já encontrou indícios de R$ 100 milhões em pavimentações fantasmas.

Também a antiga administração da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Obras Públicas (Sedop), a responsável pelo programa, antecipou pagamentos e liberou grande quantidade de dinheiro às empresas, no ano eleitoral de 2018.

E também no Asfalto na Cidade foram constatados serviços de má qualidade, ou até abandonados, além do uso eleitoreiro, como já apontou, inclusive, o Ministério Público Eleitoral (MPE).

Segundo documentos em poder do DIÁRIO, mais de 88% dos R$ 6,217 milhões que a Setran pagou à BRT foram liberados entre agosto e dezembro de 2018, ou seja, durante o período eleitoral, exatamente como aconteceu com o Asfalto na Cidade, que liberou 81% dos R$ 369 milhões que torrou em 2018, naquele segundo semestre. Outra semelhança está em uma notícia, localizada no site da Câmara Municipal de Santa Izabel do Pará e datada de 11 de janeiro de 2018.

Convênio

Nela, o então governador Simão Jatene aparece assinando um convênio para a restauração da PA 416, em companhia do prefeito da cidade, Evandro Wanatabe, do DEM, e do então presidente da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), Márcio Miranda, também do DEM, que viria a concorrer ao Governo, naquele ano, com o apoio de Jatene.

Por “coincidência”, Márcio e Izabela Jatene, filha de Jatene, foram flagrados, em 2018, “simulando” a assinatura de convênios do Asfalto na Cidade, também em grandes eventos. A diferença é que os dois não possuíam poderes para assinar convênios em nome do Governo – daí o “simulando”.

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