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TRÂNSITO

Acidente de moto vitima mais negros que brancos, diz estudo

Dados cruzados do SUS (Sistema Único de Saúde) e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que negros são principais vítimas fatais desse tipo de sinistro.

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Imagem ilustrativa da notícia Acidente de moto vitima mais negros que brancos, diz estudo camera O levantamento, produzido a partir do cruzamento de dados do SUS e do IBGE | Reprodução/ Internet

Ao menos quatro motociclistas morrem diariamente no Brasil, de acordo com o boletim Saúde da População Negra: Mortalidade e Acidentes de Motocicletas por recorte racial, produzido pelo IEPS (Instituto de Estudos para Políticas de Saúde).

O levantamento, produzido a partir do cruzamento de dados do SUS (Sistema Único de Saúde) e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), aponta um aumento de 68% em relação aos números de 2010, quando foram registrados 933 óbitos -em 2021 foram 1.569.

O número de internações também subiu e, a cada hora, ao menos 14 motociclistas são hospitalizados no país. O salto foi de 70 mil internações em 2010 para 129 mil em 2021, com prevalência de vítimas negras.

Até o início de 2016, as taxas de mortalidade para brancos e negros eram semelhantes: 0,05 e 0,06 para cada 100 mil habitantes, respectivamente. Nos últimos anos, porém, os números se distanciaram. Para brancos, o índice permaneceu o mesmo, enquanto para negros chegou a 0,08. Em janeiro de 2021, por exemplo, foram 55 mortes de motociclistas brancos (35%) e 102 óbitos de negros (65%).

Entre os fatores que podem explicar os dados, os pesquisadores ressaltam o aumento da frota de motocicletas e o crescimento vertiginoso dos serviços de entrega por aplicativo. Rony Coelho, um dos autores do estudo, destaca também o maior reconhecimento das pessoas como pretas e pardas e a melhora no registro do quesito raça nos dados de hospitalização.

"A coleta do quesito raça foi melhorando, e a taxa para negros foi piorando, revelando o tamanho da desigualdade social", comenta o pesquisador da Cátedra Çarê-IEPS, dedicada a estudos raciais.

Os dados são ainda mais discrepantes quando considerado o recorte estadual.

Em 23 das 27 unidades da federação as taxas de internação por acidentes de motos foram maiores para negros do que para brancos em 2021. Em Tocantins, Paraíba e Mato Grosso do Sul, os índices anuais de hospitalização foram 16,46, 15,21 e 14,38 a cada 10 mil habitantes negros, contra 2,05, 0,43 e 8,62 na população branca.

"O aumento dos acidentes com pessoas negras é um reflexo do que acontece na sociedade por inteiro. Quem tem a pele escura tem menos oportunidade e o que sobra é o subemprego de entrega com motocicleta. Todo mundo se aglomera nesses subempregos, e o número de acidentes fatais nos assola", diz Gilberto Almeida dos Santos, presidente do Sindimoto-SP. "É uma precarização sem fim, e isso repercute nos acidentes e nas mortes."

O problema não se restringe ao Brasil, lembra José Heverardo da Costa Montal, diretor administrativo da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego).

Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), cerca de 1,35 milhão de pessoas morrem anualmente vítimas de acidentes de trânsito e 90% dos casos ocorrem em países de renda baixa e média. Trata-se da maior causa de morte de pessoas com idade entre 5 e 29 anos no mundo.

"A aceitação da morte no trânsito tem a ver com uma questão social", diz Montal. "Nós ainda admitimos o acidente de trânsito como algo natural. Países mais desenvolvidos, como a Suécia, têm iniciativas para zerar os sinistros. O pressuposto é que não existe nenhuma justificativa moral para um sinistro de trânsito. Nada pode justificar tirar uma vida ou causar incapacidade permanente em alguém."

Nesses países com experiências bem-sucedidas, diz o especialista, o segredo está em um trabalho conjunto, dos fabricantes de veículos aos engenheiros que projetam os acostamentos, passando pelos profissionais de saúde que prestam o primeiro atendimento.

Outro aspecto fundamental, acrescenta Montal, é a formação dos condutores, com ênfase em valores de convivência e no respeito ao próximo. "Muitos condutores [no Brasil] não são habilitados do ponto de vista formal, não têm carteira de habilitação, e isso é aceito como algo normal."

Tanto o médico do tráfego como o pesquisador Rony Coelho enfatizam ainda a necessidade de rever as condições de trabalho de entregadores e mototaxistas, já que, em um sistema de remuneração por quantidade de viagens, há um incentivo direto ao abuso da velocidade.

"A violência no trânsito é mais uma das muitas violências que a população negra vivencia. Melhorar as condições gerais dessa população ajudaria a reduzir os números [de vítimas] no trânsito", finaliza Coelho.

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