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CRÍTICA

'A História do Palavrão' é diversão para quem gosta de humor obsceno

Série da Netflix mostra que antes de serem "sujos", palavrões eram palavras comuns

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Imagem ilustrativa da notícia 'A
História do Palavrão' é diversão para quem gosta de humor obsceno camera Divulgação

Aviso: Essa resenha de um documentário sobre o palavrão faz o uso indiscriminado de palavrões. Caso você seja sensível a termos como "foda", "caralho", "merda", "xoxota", "pau" e "puta", recomendamos que pule o texto.

Quando eu tinha uns 13 anos, fui recriminada pela minha mãe por dizer a palavra "merda" na mesa do almoço. Como acabava de entrar na fase infernal da puberdade, respondi atravessada: "qual é o problema de falar merda? Todo mundo caga"

Embora preguiçosa e tenha me levado a um castigo, a resposta daquela pré-adolescente não estava errada. Os palavrões, antes de serem palavrões, eram palavras comuns. Até que, por algum motivo, se tornaram obscenas. Como acontece essa transformação é o que conta a série documental "A História do Palavrão", na Netflix.

Em seis episódios apresentados por Nicolas Cage, a série mistura documentário e entretenimento para investigar a origem de alguns dos palavrões mais famosos na língua inglesa.

Se o uso descontrolado de palavrões já é uma ferramenta de comédia -Dercy Gonçalves que não nos deixa mentir-, o tom erudito para descrever termos chulos faz com que a série seja entretenimento garantido aos amantes do humor obsceno e escatológico.

Com depoimentos de linguistas, doutores, atores e comediantes, cada episódio tem um palavrão como tema. Abre com o mais popular dos palavrões "Fuck" (foder), seguido de "Shit" (merda), "Bitch" (vadia), "Dick (pau), "Pussy" (xoxota) e "Damn" (algo como "maldição", que já foi ofensivo na língua inglesa).

Embora a maioria das xingamentos seja de conhecimento universal, alguns foram trocados por palavras com outros significados. O termo "fuck" virou "caralho", talvez por uma decisão editorial, por ser mais versátil do que "foder".

No episódio "Shit", a repetição absurda da expressão é tesouro para qualquer apreciador do humor escatológico. O ator Isiah Whitlock Jr., eleito o dono da melhor pronúncia da palavra no cinema, faz uma performance de gargalhar.

É interessante como a série descreve o processo de ressignificação do palavrão. É o caso de "fuck" ou "shit", que, com a ajuda da cultura hip-hop, passaram a ser sinônimos de qualquer coisa. "Shit" virou até elogio, como conta a comediante Zainab Johnson: "Se alguém me disser 'você não é pouca merda', eu vou agradecer e dizer 'que bom que você reconheceu'".

Aqui no Brasil, a apropriação aconteceu com "foda" e "caralho", que viraram até interjeição. "Merda" ainda é uma expressão ruim, com exceção da turma do teatro.

Outro palavrão que foi reapropriada foi "bitch" (vadia). Se antes o termo definia mulheres incontroláveis e estridentes, hoje é usado como ferramenta de empoderamento. Mas o termo ainda é proibido entre os homens, especialmente héteros: "Se um homem me chamar de 'vadia', eu queimo a casa dele", comenta Johnson, a humorista.

O episódio "Pussy" (xoxota), um dos melhores da série, conta como o termo foi usado para diminuir homens, o que, claramente, era uma ofensa às mulheres. Até a década de 90, quando rappers mulheres passaram a citar a palavra em suas letras como objeto de orgulho, poder e autonomia. A comediante Sarah Silverman dá uma ótima resposta: "se quiséssemos ofender os homens, deveríamos chamá-los de saco escrotal, que se encolhe a qualquer queda de temperatura".

A série também faz crítica social ao falar da censura do selo "Parental Advisory", uma espécie de controle de pais. O fato de o selo ter surgido quando o hip-hop, com suas letras cheias de xingamentos, saiu do underground, na década de 1980, não deixa dúvidas de que foi racismo.

Um pouco menos interessante é o episódio "Dick". Como o termo sempre foi objeto de orgulho e poder, não tem plot twist. É um momento morno da série. Assim como "Damn", a mais leve das ofensas, algo como "vai para o inferno", hoje só ofenderia Roberto Carlos e olhe lá.

Mesmo com todos os aspectos interessantes, "A História do Palavrão" não seria tão fascinante sem a presença de Nicolas Cage. Sua atuação canastrona deixa o texto ainda mais cínico, como quando pergunta, no último episódio: "Existe alguma esperança nesse mundo vulgar e acelerado do caralho, merda?".

A HISTÓRIA DO PALAVRÃO

Onde: Disponível na Netflix

Classificação: 17 anos

Autor: Bellamie Blackstone

Elenco: Nicolas Cage, Nikki Glaser, London Hughes e outros

Produção: EUA, 2021

Direção: Christopher D'Elia

Avaliação: Muito Bom

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